pai outra mãe

Sinuhe LP

O pai apertou os cintos, vestiu a touca e os óculos e conferiu o combustível, por precaução. Acertou todos os botões coloridos e recebeu sinal positivo da estação aérea. Pronto para decolar. Era o pior voo da sua vida, fazia parte de um ataque. Seu avião continha uma bomba atômica que seria despejada sobre a sua cidade amada. O pai carregava o peso dela sozinho, era o seu dono, o criador. Uma bomba é sempre antes e depois: uma mudança, uma despedida. Alçou voo e se desprendeu do chão, avançou pelo corredor e bateu na porta do quarto do filho. Oba, papai, tudo bem?, disse o filho, sorrindo, colando figurinhas e separando as repetidas. Oi… respondeu seco, soltando um oi faiscante para o incêndio inevitável. Por trás do oi, uma terra arrasada, uma imagem de dor, anos difíceis…

Ilustração de Ana Zequin