o saudade

Sinuhe LP

Ô de casa! Tô aqui fora, gritava da calçada o Saudade. Batia palmas, chamava o cachorrinho, assobiava. Algumas pessoas do bairro passavam e assistiam à cena. Cochichavam. Carros cruzavam aquele momento. Eu quero entrar, ninguém atende, mas que diabo, a casa vazia ao meio-dia de uma terça-feira. O Saudade também interfonou ao vizinho, sem resposta. Cansado das tentativas, sentou no meio-fio, abriu sua maleta de bugigangas e tirou um jornal de 1996. O Saudade se entretinha com as notícias quando uma moto atravessou uma poça na sua frente: tudo molhou, ele e o jornal. Tudo bem, já decorei, disse sorrindo. O Saudade esperou por muitos anos. Ao seu lado, apareceram um caminhão, uma betoneira e pedreiros empilharam tijolos para construir um prédio naquele terreno baldio.

Ilustração de Ana Zequin